Perspectivas 2025: Semis & AI

Setor segue em destaque, mas uma nova dinâmica comercial pode gerar desafios na cadeia. Investimentos em chips especializados permanecem essenciais, enquanto o futuro do CHIPS and Science Act determinará o ritmo de competitividade e produção doméstica nos EUA.

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Nickolas Lobo

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Inteligência Artificial definitivamente foi a tese do ano de 2024, com a expectativa em torno do ganho de produtividade gerado por essa tecnologia sustentando altas de algumas das maiores empresas do mundo, incluindo big techs. Sem semicondutores, não há inteligência artificial, então esse é naturalmente um dos segmentos de destaque para observar nos próximos anos. Mas ainda há oportunidades? 

Algumas das empresas de semicondutores foram grandes vencedoras no ano, com destaque para Nvidia (NVDA (+192%), TSMC (+93%) e Marvell (MRVL +85%) se destacaram no ano. Mas, quando olhamos para a performance do setor como um todo em 2024, usando o SOXX (ETF de semicondutores), o resultado foi positivo, porém abaixo do S&P500, com aproximadamente 16% de alta até agora no ano.

Fundamentos

Pode-se dizer que toda a base para o desenvolvimento da inteligência artificial foi estabelecida por Alan Turing, que, em 1935, introduziu o conceito de computação abstrata. A máquina em questão possuía uma memória ilimitada e um scanner que podia se mover para frente e para trás, lendo símbolos e escrevendo novos de acordo com instruções armazenadas. Esse conceito de programa armazenado permitia, de forma implícita, que a máquina modificasse ou aprimorasse seu próprio código, estabelecendo a base para a computação moderna.

Avançando para os dias de hoje, vemos o surgimento dos Grandes Modelos de Linguagem (LLMs), uma classe de modelos de IA projetados para entender, gerar e processar linguagem humana usando técnicas de aprendizado profundo. Esses modelos se baseiam na arquitetura de redes neurais chamadas Transformers e são caracterizados por sua escala massiva — treinados em bilhões a trilhões de parâmetros e vastos conjuntos de dados de fontes como a internet, livros e artigos.

  • 2010: O tema experimentou avanços significativos com modelos de Deep Learning, particularmente Redes Neurais Recorrentes (RNNs) e sua variante, as Redes de Memória de Longo Curto Prazo (LSTM). Esses modelos se destacavam no processamento de sequências de texto e na captura de dependências em contextos mais longos, embora enfrentassem desafios de escalabilidade.

  • 2013: O Word2Vec do Google revolucionou o processamento de linguagem natural ao introduzir embeddings de palavras, permitindo que computadores entendessem o significado contextual das palavras. 

  • 2020: Modelos como GPT-4, Claude (Anthropic) e Gemini (Google) , com bilhões de parâmetros, estabeleceram novos padrões de versatilidade. Onde o foco para as companhias é tornar esses modelos mais eficientes, em vez de simplesmente escalá-los e aprimorando-os para áreas como saúde e finanças aproveitando o potencial da IA em nichos especializados. E a perspectiva é de que logo seja possível integrar modelos que possam processar diversos tipos de entradas — texto, imagens e áudio — simultaneamente. Isso abre portas para aplicações mais avançadas em robótica, assistentes virtuais e realidade aumentada.

Paralelamente aos avanços nos modelos de IA, o desenvolvimento de hardware teve um papel crucial. Inicialmente, nas décadas de 1990 e 2000, as GPUs foram projetadas para acelerar a renderização gráfica em videogames. Porém, em 2006, pesquisadores perceberam que as capacidades de processamento paralelo das GPUs eram ideais para treinar redes neurais, que requeriam uma enorme quantidade de operações matemáticas simultâneas — semelhante à renderização de pixels.

O boom da IA foi realmente desencadeado em 2012, quando a equipe de Geoffrey Hinton utilizou um modelo de aprendizado profundo chamado AlexNet, treinado em GPUs da NVIDIA, para vencer a competição ImageNet. Este modelo superou significativamente os modelos anteriores de classificação de imagens, demonstrando o potencial das GPUs para IA. O lançamento do ChatGPT (baseado no GPT-3.5 e GPT-4) no final de 2022 destacou ainda mais as aplicações práticas dos LLMs, desde chatbots e suporte ao cliente até geração de conteúdo e escrita criativa.

Ciclicidade dos Semis

Historicamente, a indústria de semicondutores foi altamente cíclica, impulsionada pela demanda do consumidor por PCs, smartphones e outros dispositivos. A indústria enfrentava dificuldades para equilibrar a oferta com os padrões de compra erráticos dos consumidores, levando a guerras de preços e ciclos de altos e baixos. A natureza cíclica também era influenciada pelos ciclos de CAPEX (recursos usados pelas companhias para compra de bens de capital) pré-determinados das empresas e pelas economias de escala que reduziam os custos de produção à medida que o volume aumentava.

Dito isso, o grande questionamento que se deve fazer é: o cenário agora é outro e o setor é menos cíclico? Se sim, por que? E além disso a tendência atual continuará em um ciclo de crescimento secular? 

Mudança de padrão

O mercado atual de semicondutores evoluiu significativamente, tanto no lado da oferta quanto da demanda. Diferente do passado, quando os semicondutores eram usados principalmente para eletrônicos de consumo, hoje a demanda é impulsionada pelos gastos corporativos. Data centers, infraestrutura de cloud, indústrias automotivas e gigantes da tecnologia como Microsoft e Amazon são grandes compradores, e essas indústrias dependem de semicondutores não apenas para crescer, mas também para substituir a infraestrutura envelhecida. 

Os ciclos de substituição de telefones e PCs se estabilizaram, com foco no crescimento de margem em vez de volume de vendas. Com poucas diferenças tecnológicas substanciais entre dispositivos lançados com 2-3 anos de intervalo, os consumidores agora substituem os aparelhos apenas quando envelhecem ou quebram.

O desempenho impressionante de empresas de semicondutores como NVIDIA e TSMC é amplamente impulsionado por uma “corrida” entre os hyperscalers (empresas que fornecem tecnologia em larga escala, como, por exemplo, Google, Microsoft, Amazon) para aprimorar seus modelos LLM. Essas empresas estão investindo pesadamente em chips avançados para otimizar suas capacidades de processamento de dados, visando capturar futuras receitas associadas a produtos de IA.

A rápida evolução da tecnologia levou ao desenvolvimento de unidades de processamento especializadas, projetadas para diferentes tarefas computacionais. Entre essas, destacam-se as GPUs (Unidades de Processamento Gráfico), XPUs (Unidades de Processamento Acelerado) e NPUs (Unidades de Processamento Neural). Cada um desses processadores desempenha um papel crucial na computação moderna, projetado para otimizar cargas de trabalho específicas e melhorar o desempenho em diversas aplicações. Embora a produção de Chips não seja o único impeditivo de desenvolvimento, como podemos ver abaixo, segue como o segundo fator que potencialmente mais restringirá o crescimento da capacidade computacional até 2030, o que mostra que ainda há muito espaço para a demanda de longo prazo.  

As GPUs, ou Unidades de Processamento Gráfico, foram inicialmente criadas para atender às demandas de renderização de gráficos, especialmente em videogames e aplicações visuais. Com o tempo, sua arquitetura massivamente paralela, que é excelente em realizar inúmeras operações simultaneamente, tornou-as indispensáveis para uma ampla gama de tarefas computacionais além dos gráficos. Seu design, que segue um modelo de Instrução Única, Múltiplos Dados (SIMD), permite executar a mesma operação em grandes conjuntos de dados de forma eficiente. Isso torna as GPUs ideais para aplicações como renderização de visuais de alta resolução, simulações científicas, treinamento de modelos de aprendizado de máquina e até mineração de criptomoedas. Sua força reside na capacidade de processar tarefas repetitivas e intensivas com alta eficiência.

As XPUs, por sua vez, representam uma categoria mais ampla de unidades de processamento, englobando GPUs, CPUs, FPGAs (Field-Programmable Gate Arrays) e outros aceleradores. O termo é frequentemente associado à abordagem da Intel de unificar diversas arquiteturas sob uma estrutura única, como o oneAPI. As XPUs são projetadas para flexibilidade, permitindo acelerar diversas cargas de trabalho, desde inteligência artificial (IA) até computação de alto desempenho (HPC) e análise de dados. Diferentemente das GPUs, que são otimizadas principalmente para paralelismo, as XPUs buscam integrar múltiplos tipos de aceleradores, oferecendo soluções personalizadas para desafios computacionais específicos. Isso as torna particularmente valiosas em ambientes que exigem uma combinação de capacidades de processamento, como treinamento e inferência de IA, processamento de dados em grande escala e computação de borda.

As NPUs, ou Unidades de Processamento Neural, são processadores altamente especializados, projetados especificamente para tarefas de inteligência artificial e aprendizado de máquina. Diferentemente das GPUs e XPUs, que podem lidar com uma variedade de cargas de trabalho, as NPUs se concentram nos cálculos necessários para redes neurais, como operações matriciais. Sua arquitetura é otimizada para eficiência e baixo consumo de energia, tornando-as particularmente adequadas para tarefas de inferência de IA. Essa especialização permite que processem aplicações de IA em tempo real, como reconhecimento de imagens, processamento de linguagem natural e conversão de fala em texto. As NPUs são comumente encontradas em dispositivos móveis, sistemas embarcados e ambientes de computação de borda, onde suportam tarefas de IA no dispositivo com consumo mínimo de energia e baixa latência.

Na prática, as GPUs são amplamente utilizadas para tarefas que exigem altos níveis de processamento paralelo, como jogos, modelagem 3D e treinamento de aprendizado de máquina. As XPUs, com seu escopo mais amplo, atendem a cargas de trabalho diversificadas que se beneficiam de uma abordagem integrada ao processamento. As NPUs, com seu foco em IA, são cada vez mais cruciais em áreas como veículos autônomos, tomadas de decisão em tempo real e computação móvel. 

Cada uma dessas unidades de processamento encontrou seu espaço no cenário da computação, possibilitando avanços tecnológicos ao atender a necessidades específicas. O fato é que cada vez mais está sendo exigida uma maior capacidade dos processadores uma vez que os modelos treinados demandam cada vez mais. Como podemos ver na imagem abaixo, nos 50 principais modelos da atualidade, a medida de “teraflops” (medida de desempenho de processamento de múltiplas operações por segundo) cresceu 5.6x por ano desde 2010 , e a tendência é que conforme os modelos evoluam, o processamento deve acompanhar.

Efeito Trump

A eleição de Donald Trump como presidente em 2024 deve trazer mudanças substanciais para a indústria de semicondutores, principalmente por meio de alterações nas políticas comerciais, incentivos à manufatura doméstica e dinâmicas de oferta.

A proposta de aumentos nas tarifas pode ser comprometedora para o setor, incluindo até 50% para importações de semicondutores e 60% para bens importados da China. Embora essas medidas tenham como objetivo promover a produção doméstica, elas podem causar disrupções na cadeia de fornecimento e aumentar os custos para fabricantes (e, consequentemente, para os consumidores). As empresas dependentes de produção internacional, especialmente na China, podem enfrentar desafios imediatos ao lidar com este novo cenário tarifário — vale destacar que esse não não é necessariamente o caso para TSMC, que é baseada em Taiwan e é a maior produtora de chips, fornecendo para Nvidia, Broadcom, arm, entre outras .

Em relação ao futuro da política do CHIPS and Science Act, criado para fortalecer a  produção de semicondutores nos EUA, é incerto sob o governo de Trump. Podem ocorrer possíveis cortes nos incentivos financeiros, que podem enfraquecer a competitividade das empresas americanas e desestimular novos investimentos na produção doméstica - lembrando que Nvidia e Broadcom, por exemplo, são companhias que fazem os designs dos chips, a produção é inteiramente de partes terceiras, no caso a TSMC. 

Uma possibilidade é de que, no cenário com tarifas mais altas e tensões comerciais, as empresas de semicondutores acelerem os esforços para se desvincular da China. Muitas estão transferindo operações de montagem e testes para países do Sudeste Asiático, para evitar tarifas, o que por sua vez pode gerar um aumento de pressões dos Estados Unidos e China sobre Taiwan, agravando o cenário de geopolítica.

Seleção das maiores companhias que tem exposição a tese e o consenso do mercado em relação às companhias consolidado pela Factset: 

NVIDIA Corp. se dedica ao design e fabricação de processadores gráficos para computadores, chipsets e software multimídia relacionado. Opera por meio dos seguintes segmentos: Unidade de Processamento Gráfico (GPU) e Computação e Redes. O segmento GPU inclui GPUs GeForce para jogos e PCs, o serviço de streaming de jogos GeForce NOW e a infraestrutura relacionada, GPUs Quadro e NVIDIA RTX para gráficos de estações de trabalho empresariais, software vGPU para computação visual e virtual em nuvem, plataformas automotivas para sistemas de entretenimento e o software Omniverse Enterprise para construção e operação de aplicações de metaverso e internet 3D. O segmento Computação e Redes consiste em plataformas de computação acelerada para Data Centers e plataformas de rede ponta a ponta.

Broadcom Inc. é uma empresa global de tecnologia que projeta, desenvolve e fornece soluções de semicondutores e software de infraestrutura. Opera por meio do segmento de Soluções de Semicondutores refere-se a linhas de produtos e licenciamento de propriedade intelectual, e pelo  segmento de Software de Infraestrutura abrange soluções de mainframe, distribuídas e de cibersegurança, além do negócio FC SAN.

Advanced Micro Devices, Inc. (AMD) atua no fornecimento de negócios de semicondutores. Opera por meio dos seguintes segmentos: Data Center, Cliente, Jogos e Embutidos. O segmento Data Center inclui CPUs para servidores, GPUs, aceleradores de IA, DPUs, FPGAs, SmartNICs e produtos Adaptive SoC. 

QUALCOMM, Inc. desenvolve e comercializa tecnologias fundamentais e produtos utilizados em dispositivos móveis e outros produtos sem fio. Desenvolve e fornece circuitos integrados e software de sistemas baseados em tecnologias para uso em comunicações de voz e dados, rede, processamento de aplicativos, multimídia e produtos de sistema de posicionamento global. Também concede licenças e fornece direitos para uso de partes do portfólio de propriedade intelectual da empresa.

Texas Instruments Incorporated se dedica ao design e fabricação de semicondutores. Opera por meio dos seguintes segmentos: Analógicos, Processamento Embutido e Outros. Os semicondutores analógicos convertem sinais do mundo real, como som, temperatura, pressão ou imagens, por meio de condicionamento, amplificação e, frequentemente, conversão em fluxo de dados digitais que podem ser processados por outros semicondutores, como processadores embutidos.

Marvell Technology, Inc. se dedica ao design, desenvolvimento e venda de circuitos integrados. Seus produtos incluem unidades de processamento de dados, soluções de segurança, automotivos, DSPs coerentes, módulos ópticos DCI, controladores Ethernet, PHYs Ethernet, switches Ethernet, drivers lineares, PAM DSPs, amplificadores de transimpedância, canais de fibra, controladores de HDD e SSD, aceleradores de armazenamento, ASICs e soluções governamentais da Marvell. 

Taiwan Semiconductor Manufacturing Co., Ltd. (TSMC) atua na fabricação e venda de circuitos integrados e dispositivos semicondutores em wafer. Seus chips são usados em computadores pessoais e periféricos, aplicativos de informação, produtos de sistemas de comunicação com e sem fio, e equipamentos automotivos e industriais, incluindo eletrônicos de consumo, como players de discos compactos digitais, televisores digitais, consoles de jogos e câmeras digitais. 

Micron Technology, Inc. fornece soluções inovadoras de memória e armazenamento. O segmento CNBU inclui produtos e soluções de memória vendidos para mercados de clientes, servidores em nuvem, empresas, gráficos e redes. O segmento MBU está envolvido em produtos de memória e armazenamento vendidos para mercados de smartphones e outros dispositivos móveis. O segmento EBU foca em produtos de memória e armazenamento vendidos para mercados automotivos, industriais e de consumo. O segmento SBU consiste em SSDs e soluções em nível de componentes vendidos para mercados de armazenamento corporativo, em nuvem, de clientes e de consumo.

Intel Corp. se dedica ao design, fabricação e venda de produtos e tecnologias de computação. Oferece plataformas de computação, redes, armazenamento de dados e comunicação. A empresa opera por meio dos seguintes segmentos: Grupo de Computação para Clientes (CCG), Data Center e IA (DCAI), Rede e Edge (NEX), Mobileye, Sistemas e Gráficos de Computação Acelerada (AXG), Serviços de Fundição Intel (IFS) e Outros. 

Lam Research Corp. se dedica ao design, fabricação, marketing, reforma e fornecimento de equipamentos de processamento de semicondutores usados na fabricação de circuitos integrados. 

Analog Devices, Inc. é uma empresa de semicondutores que combina tecnologias analógicas, digitais e de software em soluções de engenharia. Seus produtos incluem sinais analógicos e mistos, gestão e referência de energia, amplificadores de frequência de rádio e referência, sensores e atuadores, e processamento e sistema de sinais digitais. 

Usando o consenso das projeções fornecidos pela Factset, quando olhamos para o setor como um todo, podemos observar que a relação de crescimento esperado de lucro por ação (Earnings per Share - EPS) e múltiplo das companhias, o setor se posiciona abaixo da linha de regressão do que é apresentada para o S&P 500, o que significa que, para um mesmo nível de crescimento, o setor negocia abaixo do S&P. Sobre esse ponto, vale ressaltar que dos setores apresentados no nosso relatório de perspectivas para 2025, esse é o setor que embuti o maior nível de crescimento esperado do consenso, que por sua vez pode gerar uma maior correção caso o crescimento não venha de encontro ao esperado.

Nickolas Lobo

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